segunda-feira, 8 de março de 2010

Black (15/01/98 - 09/03/10)


Cachorros são divertidos. Gosto deles desde pequeno. Gosto de pessoas (algumas), gatos (muitos) e de todos os cachorros do mundo. Meu amor aos animais se resume a isso. Ou quase isso.
Tive alguns cães em minha humilde casa piritubana, mas nunca duravam mais de três anos por lá. Meus pais sempre arrumavam uma desculpa para mandar todos embora.
"Ficou muito grande e tá gastando demais", era a mais utilizada.
Quando me mudei para um apartamento na Casa Verde, logo pensei, "Cachorro nunca mais, merda". Mas aí minha mãe perdeu o emprego e achou que iria se sentir sozinha em suas tardes ociosas na cozinha. Ela precisava de um melhor amigo do homem ou de um melhor amigo da mulher.
Papai, que nunca foi bobo, entendeu o recado.
"Tá bom, caralho. Vamos comprar uma merda de um cachorro."
Fiquei feliz. Como fiquei feliz.
Fui com irmãs, papai e mamãe atrás de um daqueles salsichas do antigo comercial da Cofap.
Aí a lembrança é meio nebulosa (eu passava muito tempo fumando na rua nessa época), e só lembro de já estar em casa com meu novo cachorrinho no colo. Nem sei como escolhemos, exatamente, aquela figura.
Minha mãe, após ter batizado os três filhos com nomes compostos de novela mexicana, achou que ainda não havia perdido o mojo nesse seu talento e lançou: "Aaaaaah, ele é tão pretinho. Vai se chamar Black."
Me senti o filho o Olivetto. Novamente.

Bom, o Black cresceu, e dava para perceber, desde cedo, que ele não era nada normal. Jogávamos a bolinha, ele olhava, virava para o outro lado e ia comer. A gente chamava ele, que olhava pro outro lado e ia comer.
Depois de um tempo ele aprendeu a morder os outros. Aí virou verão. Black ficou viciado em carne humana.
A maior diversão do condomínio era quando eu descia, chamava um pessoal, soltava ele da coleira e duvidava que alguém conseguisse colocar a bendita no pescoço dele novamente. Hahaha. Eram tempos divertidos. Ninguém nunca conseguiu, e todos achavam o máximo um cachorro daquele tamanho botando marmanjos pra correr.

Na sua lista de assassinatos somente coisa pouca. Coisa boba.
Um hamster ele matou de susto, e um gato ele assustou "sem querer", fazendo com que o felino morresse esmagado pelo portão automático da garagem.

Ah, Black. Você não era mau. Você era divertido e admirado. Todos te respeitavam por ser tão verdadeiro. E por ter conseguido fazer sete filhotes com apenas uma bola no saco.

Ontem, passei o dia de ressaca com ele no sofá. Vimos, na sequência: Ghost (um sinal?!?!); O silêncio dos inocentes (seria Hannibal the canibal o verdadeiro pai de black); Elisabeth (nenhuma ligação); Forrest Gump (sei lá).
Hoje, ele foi passear logo cedo e caiu duro na rua. No caminho até o veterinário mordeu o guarda de trânsito, salvou um senhora que estava sendo assaltada, pegou o telefone de quatro cadelas, tomou um conhaque no bar e deu uma tragada profunda num Marlborão.
"I´ll be back" foram suas últimas palavras antes de entrar na sala para sua dose final de metadona e morfina.

Black. Amigo. O mundo vai ficar bem mais feio e chato sem você.
Pra sempre.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Vai Brasil... vai...

A camisa nova da seleção brasileira de futebol é feita com poliéster reciclado.
Garrafas PET retiradas do meio ambiente.


Ah, vai tomar no cu.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

A fama

02 de fevereiro; esse blog tem a honra de receber o comentário da pessoa mais famosa da internet:

"Anônimo disse...
PORRA MANO, VC MORA NO PORTO POR ACASO??
Uma dica: pelo que eu me lembro não tem quadro nenhum"

09 de fevereiro; mais um comentário. Poucas vezes na vida me senti tão querido. Detalhe para o "jão" saído de dedos gordinhos e peludos hidratados com porrinha transparente. É muita malandragem:
"Anônimo disse...
Cacete, me diga uma coisa por que em nome de tudo que é sagrado, um maluco vai tentar achar pêlo em ovo, hein jão?"
13 de fevereiro; seu irmão, ofendido com a minha burrice, entra em sua defesa. O nível fica baixo com xingamentos pesados do tipo "animal sem teta". Uma vez, muitos anos atrás, em uma briga, ouvi algo tão inesquecível quanto: "Vai se fuder, seu veado sem cu"
"Anônimo disse...
Ôôôô sem cultura, o 1° anónimo [sic] estava falando do Condominio Porto Seguro, animal sem teta..."
15 de fevereiro; rir com quatro dedos. Sinal de evolução.
"Anônimo disse...
Blog de bosta ahusauhsauhuashasuh não sei nem como vc consegue continuar com essa merda aí, desiste cara!"
Tadinho, nem sabe que eu desisti em, sei lá, 98 ou 99.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O pegador do campo de centeio

"Começou então a namorá-la na igreja, esforçando-se por falar com ela. Ao princípio, Fiênitchka tinha medo dele. Um dia, à tarde, encontrou-o numa trilha estreita, passagem pouco transitável, que os pedestres abriram num campo de centeio. Ela entrou na alta e densa plantação de centeio, cheia de ervas daninhas e flores, com o único propósito de evitar o encontro. Nicolau Pietróvitch viu sua cabecinha através das espigas douradas, de onde ela o espiava como uma gatinha medrosa. Gritou carinhosamente:
- Bom dia, Fiênitchka! Pode aproximar-se. Não mordo."
Pais e filhos. Ivan Turgueniev

Presente de namorada, lembro onde comecei e terminei de ler O apanhador no campo de centeio. Bom livro. Jovens; eternos rebeldes.
"Sabe, o protagonista me lembra você", foi o que eu tive que ouvir...
ZZZZzzzzzzZZZZZZzzzzzz
Meses depois, namoro ainda em alta, ganhei a caixa azul com as fitas dos episódios IV, V e VI de Star Wars. Sem palavras. Emocionado, quase troquei alianças no dia.
"Você me lembra o Han Solo", era o que eu queria ter ouvido.

Se fudeu, Salinger. A morte te achou.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Tem figura?

Escrever, às vezes, enche o saco. Ler também.
... <- é pra clicar.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Seguro desemprego

Hoje, na Caixa:
- Oi. Sabe me dizer quem é a Silvana?
- É aquela moreninha no balcão.
- Qual? A da direita?
- Não, a outra.
- Senhora, Silvana é a negra da esquerda ou a morena da direita?
- Isso, isso, a da esquerda.

O Brasil miscigenado e a eterna dificuldade em chamar um negro de... negro.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Andrea

Um dia me apaixonei por uma garota no trabalho. Lindos olhos azuis, franja no rosto, baixinha e com um sorriso lindo.
Depois de me apaixonar, geralmente, levo uns quatro anos até falar com a fêmea. Dessa vez, levei só umas quatro semanas.
Estranho, no mínimo.
Entre uma lorota e outra, daquelas que a gente sempre lança pra mostrar nosso gosto refinado, citei que gostava de ler livros, comer macarrão e dormir de meias.
Depois da conquista, o amorzinho manjado.
Todo dia era uma chamada no ramal:
“Alô.”
“Oiê. Fui na padaria e lembrei de você, aí te trouxe um chocolate”
“Aaaaaah, que fofo. Vou passar aí na sua sala pra pegar.”
E todo dia era um e-mail:
“Oi. Tô com saudade já :)”
“Oi. Também tô. Esse dia não acaba nuuuuuuuunca. rs ;)”
Enfim, todo mundo sabe como é.
Numa tarde toca o meu ramal:
“Alô.”
“Oiê. Então, outro dia chegou um livro aqui na redação, né. Eu levei pra casa e li rapidinho. Acho que você vai gostar. Vou passar aí pra te entregar.”

Pronto. Ia ter que ler o troço todo, gostar e ainda dar minha opinião. Já tava ficando trabalhoso demais esse namorico.

Peguei o livro. O Estaleiro - Juan Carlos Onetti.
Cara de paisagem.
Nunca tinha ouvido falar. Nunca tinha lido nada sobre.
Mas, era quinta-feira. O que se faz, aos 22 anos, numa noite de quinta-feira? Fun House? Opa, é claro.
Fui ler na cama.
O livro é curto e a noite é longa.
“Mas peraí. Porque que eu nunca ouvi falar nesse filho da puta?”
Devolvi o livro com uma dor no coração e fui buscar os outros títulos do cara. Não tendo em português, o dicionário Larousse espanhol-português ajudaria (R$ 43,90. Cortesia da Editora Escala).

O Onetti é bom. É simples. Não tem lição de moral. Quase todos os seus livros e contos são sobre a cidade de Santa Maria e seus habitantes. O Estaleiro é a história do Gordo Larsen que volta pra cidade, anos depois de ter sido expulso. O porquê dele ter sido expulso, só dá pra entender no Juntacadáveres, livro que foi lançado anos depois, mas a ordem pouco importa. Um livro costura o outro, e no final dá na mesma; todo mundo se fode. E dá pra ler tudo isso de ressaca, de bom humor, da pá virada, no ônibus, na rua, na chuva, na fazenda e, suspeito, até com um grande pau no cu.
Ok. A Vida Breve precisa de um pouco mais de concentração.
Tiremos o pau do cu.
O velho escritor passou os últimos dez anos deitado na cama, por opção própria, apenas lendo, fumando, escrevendo e dizendo que toda a sua obra era um plágio da obra do Faulkner. É isso o que eu sei sobre ele, e é isso que eu quero saber sobre ele.

Toda vez que eu leio alguma coisa do Onetti, eu lembro da garota. Nosso "namoro" durou até a prorrogação. Depois terminou. Todos terminam. Ano passado, no dia do meu aniversário, eu já sabia que iria sair do trampo, e na empresa, tirando o R.H, somente ela sabia também.
Toca o meu ramal:
“Alô.”
“Oh, trouxe seu presente de aniversário e despedida.”
“Eba. Cadê?”
“Passa aqui pra pegar.”
Abri o embrulho. Era a edição do Estaleiro de três anos antes. A capa azul estava suja e com a cor desbotada. Os olhos dela eram os mesmos.